“Fragmentado” e a Representação da Saúde Mental: O Que é Fato e O Que é Ficção?

 

O filme Fragmentado (2016), dirigido por M. Night Shyamalan, trouxe para o público uma história intensa sobre um personagem com Transtorno Dissociativo de Identidade (TDI). Interpretado por James McAvoy, Kevin Wendell Crumb convive com 23 personalidades distintas, sendo controlado por uma entidade chamada “A Besta”. Embora o filme tenha sido elogiado pela atuação e narrativa envolvente, ele também levantou debates sobre a forma como os transtornos mentais são retratados no cinema. Mas, afinal, o que Fragmentado acerta e onde ele se afasta da realidade científica sobre o TDI e a saúde mental?

 

O que é Transtorno Dissociativo de Identidade?

O TDI, antigamente conhecido como Transtorno de Personalidade Múltipla, é uma condição psiquiátrica rara e complexa, caracterizada pela presença de duas ou mais identidades ou estados de personalidade distintos dentro do mesmo indivíduo. Essas identidades podem apresentar diferenças significativas em comportamento, memórias e até mesmo em habilidades motoras e cognitivas.

Esse transtorno surge, na maioria dos casos, como um mecanismo de defesa contra traumas severos, geralmente vivenciados na infância. Para lidar com experiências dolorosas, a mente fragmenta a identidade da pessoa, criando diferentes “partes” que assumem o controle em diferentes momentos.

 

As Verdades e os Mitos Sobre o TDI no Filme

Embora o filme acerte em alguns aspectos do TDI, ele exagera e distorce outros pontos, contribuindo para a perpetuação de estereótipos negativos sobre saúde mental.

Realidade: O filme corretamente ilustra como diferentes identidades podem ter diferentes traços de personalidade, modos de falar e até mesmo habilidades físicas. Na vida real, algumas pesquisas indicam que mudanças neurofisiológicas podem ocorrer entre identidades de um mesmo indivíduo, embora não da maneira dramática como no filme.

Ficção: A noção de que uma identidade pode alterar drasticamente a biologia do corpo, como quando “A Besta” desenvolve superforça e resistência sobre-humanas, não tem base científica. Embora o cérebro tenha grande influência sobre o corpo, as mudanças descritas no filme vão além do que a ciência entende sobre o TDI.

Realidade: O filme destaca que muitos pacientes com TDI têm históricos de abuso severo na infância, o que é condizente com achados clínicos sobre o desenvolvimento desse transtorno.

Ficção: O filme reforça a ideia de que indivíduos com TDI são perigosos e propensos à violência, algo que não é sustentado pela literatura científica. Na realidade, pessoas com TDI costumam ser mais vulneráveis a sofrer violência do que a cometê-la.

 

 

O Impacto da Representação no Estigma da Saúde Mental

Embora filmes como Fragmentado despertem interesse pelo estudo dos transtornos mentais, a forma como esses temas são retratados pode contribuir para o estigma e a desinformação. Ao associar TDI a características sobrenaturais e comportamento violento, o filme pode reforçar medos infundados e dificultar a empatia e compreensão do público em relação a quem convive com o transtorno.

Esse tipo de narrativa pode impactar negativamente pacientes reais, tornando mais difícil para eles procurarem tratamento e enfrentarem o preconceito social. A psiquiatria e a psicologia trabalham constantemente para desmistificar esses transtornos e oferecer abordagens terapêuticas eficazes, como a terapia cognitivo-comportamental e a terapia focada na integração das identidades.

 

Conclusão

Fragmentado é um thriller psicológico envolvente, mas sua representação do TDI e da saúde mental deve ser vista com cautela. Apesar de trazer elementos que refletem aspectos reais do transtorno, o filme também exagera e distorce características importantes, alimentando equívocos sobre a condição. A conscientização sobre saúde mental é essencial para combater o estigma e garantir que pessoas com transtornos dissociativos recebam o suporte adequado. O cinema tem um papel importante na educação do público, e representações mais precisas e humanizadas podem ajudar a construir uma compreensão mais realista e empática sobre essas condições.

 

 

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